LGPD na gestão de pessoas: Transparência e ética no uso de dados dos colaboradores

LGPD na gestão de pessoas: Transparência e ética no uso de dados dos colaboradores


A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) mudou profundamente a forma como as empresas lidam com as informações pessoais no Brasil, e se por um lado a preocupação maior costuma ser com os dados de clientes e consumidores, por outro,
os dados dos próprios colaboradores também estão no centro da legislação e exigem atenção redobrada por parte do setor de Recursos Humanos.

Neste artigo, vamos entender como a LGPD se aplica à gestão de pessoas, por que a transparência e a ética no uso de dados são essenciais, e como as empresas podem adequar suas práticas para garantir segurança jurídica, reputacional e organizacional.

O que é a LGPD e como ela impacta o RH?

A LGPD (Lei nº 13.709/2018) entrou em vigor em 2020 e foi inspirada no modelo europeu de proteção de dados, ela define regras claras sobre como empresas e instituições devem coletar, armazenar, tratar e compartilhar dados pessoais, sempre com o consentimento e a ciência do titular no caso do RH, o colaborador.

Segundo a advogada e especialista em proteção de dados Laura Schertel Mendes, professora da UnB, “a LGPD é uma mudança de paradigma: o dado pessoal deixa de ser propriedade da empresa e passa a ser um direito do indivíduo”.

Ou seja, o colaborador tem o direito de saber quais dados a empresa possui sobre ele, para que estão sendo utilizados e com quem são compartilhados, além disso, ele pode solicitar a exclusão ou correção dessas informações a qualquer momento, salvo obrigações legais.

Quais dados do colaborador estão sob a LGPD?

Praticamente todos os dados pessoais tratados pelo RH entram na abrangência da LGPD, como:

  • Nome, CPF, RG, endereço, telefone, e-mail
  • Dados bancários para folha de pagamento
  • Dados de saúde (atestados, exames admissionais)
  • Informações de dependentes para plano de saúde
  • Histórico de desempenho, avaliações e feedbacks
  • Dados comportamentais coletados em softwares de produtividade

Além disso, a LGPD traz uma categoria especial chamada “dados sensíveis”, que exigem ainda mais cuidado. São eles: convicções religiosas, opiniões políticas, origem racial, orientação sexual, dados de saúde ou biometria.

Transparência e ética: pilares da LGPD na gestão de pessoas

A aplicação da LGPD vai muito além da formalidade jurídica, ela traz à tona uma nova cultura organizacional baseada em transparência, respeito e ética no tratamento da informação. Como destaca Bruno Bioni, fundador do Data Privacy Brasil, “privacidade é sobre poder: quem tem informação sobre o outro, exerce poder. A LGPD vem para reequilibrar essa relação”.

Isso significa que o RH deve adotar uma postura ativa na comunicação clara com os colaboradores, explicando com objetividade:

  • Quais dados são coletados e por quê
  • Quem tem acesso a essas informações
  • Por quanto tempo os dados serão armazenados
  • Quais são os direitos do colaborador sobre os próprios dados

Essa abordagem não apenas atende à legislação, mas fortalece a relação de confiança entre empresa e colaborador um fator crucial para o engajamento e retenção de talentos.

Riscos de descumprimento e impactos para a empresa

Ignorar a LGPD pode gerar consequências sérias, as penalidades previstas incluem multas de até 2% do faturamento anual da empresa, limitadas a R$ 50 milhões por infração, além de advertências e bloqueio dos dados.

Mas os riscos vão além do financeiro, uma denúncia de uso indevido de dados pode prejudicar a reputação da marca empregadora, causar insatisfação interna e comprometer a atração de novos talentos.

Além disso, ações trabalhistas que envolvam questões de privacidade podem se tornar mais comuns, exigindo do jurídico e do RH uma atuação preventiva cada vez mais estratégica.

Exemplos práticos: o que o RH deve (e não deve) fazer

Boas práticas:

  • Consentimento claro no processo seletivo: Ao solicitar dados como pretensão salarial, estado civil ou fotos, explique o motivo e peça autorização explícita.
  • Controle de acesso restrito: Só pessoas diretamente envolvidas na gestão daquele colaborador devem acessar seus dados.
  • Treinamento da equipe de RH: Capacite os profissionais sobre privacidade de dados, confidencialidade e protocolos de segurança.
  • Política interna de privacidade: Crie e divulgue um documento claro que explique como a empresa trata os dados pessoais dos colaboradores.
  • Revisão de contratos com terceiros: Fornecedores de benefícios, sistemas de folha, plano de saúde — todos devem estar alinhados com a LGPD.

O que evitar:

  • Armazenar dados em planilhas abertas e não protegidas
  • Compartilhar informações pessoais por e-mail sem criptografia
  • Utilizar dados para finalidades diferentes das originalmente informadas
  • Coletar informações excessivas sem justificativa legal ou funcional

Dicas práticas para adequar o RH à LGPD

  1. Mapeie todos os dados tratados pelo setor de RH: identifique quais informações são coletadas, por quem, com que finalidade e onde são armazenadas.
  2. Implemente o conceito de "privacy by design": desde a concepção de novos processos ou sistemas, a privacidade deve estar no centro das decisões.
  3. Estabeleça um canal de atendimento para solicitações de dados: o colaborador deve ter um meio fácil para acessar, corrigir ou excluir suas informações, sempre que permitido por lei.
  4. Nomeie um encarregado de dados (DPO): essa figura será responsável por atuar como ponte entre a empresa, os titulares dos dados e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
  5. Atualize políticas e contratos internos: revise cláusulas que tratem de dados pessoais e inclua termos de confidencialidade específicos, quando necessário.

LGPD como oportunidade para o RH estratégico

Mais do que um desafio jurídico, a LGPD representa uma oportunidade de ouro para o RH se posicionar como parceiro estratégico na transformação cultural da empresa.

Ao assumir a liderança na proteção de dados dos colaboradores, o setor contribui diretamente para:

  • Fortalecer a marca empregadora
  • Reduzir riscos trabalhistas e jurídicos
  • Promover um ambiente de trabalho mais ético e seguro
  • Estimular a confiança e o engajamento das equipes

Conclusão

A LGPD chegou para ficar, e as empresas que compreenderem sua profundidade vão sair na frente. No centro de tudo, está o respeito pelo indivíduo — e isso começa dentro de casa, com os próprios colaboradores.

No fim das contas, tratar os dados com ética é tratar pessoas com respeito. E esse é um princípio que deve estar no coração de toda gestão de pessoas que se propõe a ser humana, moderna e responsável.

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